Homens e mulheres: diferenças na relação com o dinheiro

Como variam os comportamentos em relação ao dinheiro na vida de homens e mulheres?
31/10/2019

Independente do gênero, sentir-se financeiramente capaz tem impacto significativo na saúde mental, tanto de homens como de mulheres, gerando sentimentos positivos, como segurança, satisfação e elevação da autoestima.

Essa afirmação faz parte da tese “Atitudes, crenças e comportamentos de homens e mulheres em relação ao dinheiro na vida adulta” da doutoranda Valéria Maria Meirelles, para a PUC-SP. O estudo destaca que os padrões de uso do dinheiro são afetados pelo período da vida adulta – a idade – em que se encontra a pessoa, bem como pelo sexo e pelo estado civil.

Mas, afinal, como homens e mulheres diferenciam-se no uso do dinheiro? As mulheres realmente gastam mais, como muitos costumam dizer? Os homens têm mais tendências aos riscos financeiros? Quem cuida melhor do dinheiro? Confira:

Histórico

Antes de analisar a situação atual, é preciso rever alguns fatos históricos que interferem no momento presente. Afinal, no Brasil, convivem desde pessoas que foram educadas na época das grandes guerras mundiais (atualmente, na faixa dos 65 anos ou mais) até adultos jovens (na faixa etária até 40 anos), que já nasceram inseridos na sociedade tecnológica. E os contextos histórico e educativo-familiar interferem muito nos valores e crenças que adquirimos em relação ao dinheiro.

Portanto, em relação às questões de gênero, é importante lembrar que, no Brasil (assim como em outros países), por décadas, o papel de provedor financeiro cabia aos homens, enquanto as mulheres eram colocadas como guardiãs da moral da família.

Porém, com o movimento feminista, ocorreram profundas modificações na situação profissional das mulheres (a despeito de situações que continuam sendo transpostas dia a dia). Ao entrarem no mercado de trabalho e passarem a ter seu próprio dinheiro, as mulheres passaram, então, a viver uma situação nova, que não lhes foi ensinada, especialmente em relação ao uso do dinheiro.

Todo esse contexto histórico, assim como as crenças e valores dele advindos, continuam se refletindo na sociedade brasileira. Exemplo disso é a desigualdade salarial ainda existente entre homens e mulheres. Segundo o IBGE, a renda média de trabalho das mulheres chega no máximo a 73,8% do rendimento dos homens.*

*Publicação Estatísticas de Gênero – Uma Análise dos Resultados do Censo Demográfico 2010 – Sistema Nacional de Informações de Gênero – IBGE, 2014.

Administração familiar

Seja para homens ou mulheres, casados ou separados, o fato de ter uma família, costuma levar a atitudes de maior retenção e controle do dinheiro, em comparação ao que normalmente é observado entre solteiros de ambos os gêneros.

As mulheres em cujas vidas a família exerce um papel central, demonstram usar mais o dinheiro para cuidar do espaço doméstico e dos filhos.

Inclusive, tem aumentado a contribuição dos rendimentos da mulher na economia familiar. Segundo o IBGE, o rendimento das mulheres representa, pelo menos, 40,9% do rendimento das famílias. Essa porcentagem é ainda maior entre mulheres negras e famílias rurais. E ainda se considera que, em 87,4% das famílias monoparentais, as mulheres são as únicas responsáveis financeiras.

Outro estudo, da Sophia Mind Pesquisa e Inteligência de Marketing Feminino, mostra que as mulheres controlam 66% do que é consumido pelas famílias.

Essa dedicação histórica à família e ao casamento explica, ao menos em parte, a observação de que as mulheres levam mais tempo para atingir a satisfação financeira do que os homens. Por outro lado, as casadas costumam ser mais eficientes no uso do dinheiro para tomar decisões domésticas e, normalmente, fazem escolhas mais adequadas e cautelosas em termos de custos das compras.

Consumo

As opiniões de que as mulheres gastam mais do que os homens nem sempre são confirmadas. Ainda existe uma ideia muito arraigada de que o consumo é indissociável do sexo feminino. Mas se formos analisar as causas dessa crença, veremos que se trata muito mais de uma generalização sobre as diferentes formas de consumo de cada um dos sexos e sobre os produtos e serviços de preferência de cada um.

Para começar, devemos levar em conta os gastos da mulher com toda a família (inclusive com o marido, em alguns casos). Por normalmente ser a mulher a responsável pelas compras da casa e pela administração do espaço doméstico, pode-se dizer que, em geral, ela esteja mais propensa às compras.

Em relação a gastos pessoais, o norte-americano Alan Feigenbaum relembra, no caso das mulheres, que “as expectativas em relação à beleza são mais altas para elas, o que faz com que tenham mais gastos com roupas e cosméticos, até mesmo quando o intuito é vestir-se adequadamente para o trabalho”.

Por outro lado, os homens também compram um determinado veículo, por exemplo, ou priorizam morar em uma região, muitas vezes, pensando nas convenções sociais. Muitos, ainda, apresentam gastos pessoais mais ligados à tecnologia, aos esportes ou à alimentação, por exemplo.

É claro que ambos os casos tratam de generalizações, pois homens também podem se interessar por aparência e beleza, e mulheres, por carros, por exemplo.

De qualquer forma, os gêneros podem diferenciar-se, em geral, nos tipos de gastos. E também podem ser diferentes as formas de gastar. Enquanto muitas mulheres costumam confessar o prazer de ir às compras em shoppings ou centros comerciais, por exemplo, muitos homens são mais adeptos de compras online e do consumo de assinaturas.

Na verdade, os padrões de consumo variam não apenas conforme o gênero, mas também são influenciados pela educação familiar, pelo histórico de experiências vividas, pela idade, pelo estado civil, pela situação financeira geral, entre outros fatores. Por isso, é impreciso generalizar os padrões de consumo apenas observando os gêneros.

Investimentos

Outra opinião comum, na diferença entre os gêneros na relação com o dinheiro, é de que os homens são mais afeitos aos riscos e mais propensos a investir seu dinheiro.

Em geral, comprova-se que as mulheres costumam ter um comportamento mais conservador em relação às finanças, buscando aplicações mais seguras, como a poupança.

É de se observar, porém, que a desigualdade salarial e, por vezes, o foco nos gastos familiares, podem contribuir para um acúmulo financeiro menor por parte das mulheres, diminuindo suas possibilidades de investimento.

Além disso, a assessora em câmbio e investimentos, Aldrey Zago Menezes, observa que, sob uma perspectiva histórica, “a mulher ainda está se descobrindo como potencial investidora, empreendedora, alguém que consegue controlar suas finanças. É um processo, mas falta ainda se arriscar um pouco mais e conhecer novas opções de investimentos”.

Mas a falta de uma educação financeira consistente não está restrita às mulheres. E infelizmente, ainda estamos longe de poder generalizar os homens como bons investidores. Assim, as iniciativas de educação financeira e aquelas em prol da poupança e do investimento merecem ser valorizadas em ambos os sexos.

Negócios

A participação das mulheres no mercado de trabalho aumenta progressivamente. Segundo o IBGE, a proporção da população feminina em idade ativa que se encontrava trabalhando ou procurando trabalho cresceu 4,5 pontos percentuais em dez anos (entre 2000 e 2010), enquanto a taxa de atividade dos homens diminuiu em 4 pontos nesse período.

As mulheres já ocupam cargos de gerência e outras formas de chefia, destacam-se a frente de órgãos internacionais, sem falar nos postos de presidência e ministério já ocupados por mulheres.

Contudo, a média salarial feminina continua sendo inferior à masculina. De acordo com o IBGE, as mulheres recebem menos do que os homens em todas as áreas, chegando seus ganhos somente até 53,2% do ganho masculino nos serviços, e a 78,5%, em humanidades e artes.

A despeito de crenças no predomínio da emotividade feminina, muitas mulheres já demonstraram a igualdade de condições racionais e intelectuais, independente do sexo. Os indicadores, inclusive, demonstram maior escolarização feminina.

Aliás, as mulheres de negócios costumam apresentar nível educacional superior ao dos homens, mas são mais semelhantes a eles em termos de reconhecimento de suas capacidades financeiras do que as mulheres que se identificam com os padrões tradicionais de gênero.

Homens x Mulheres

Assim, a título de conclusão, conforme observado pela doutoranda Maria Meirelles, constata-se que, em geral, as mulheres tendem a usar o dinheiro muito mais como um meio para atingirem seus objetivos e os de suas famílias, enquanto para os homens, o dinheiro é um fim em si mesmo, conferindo-lhes poder e sentindo-se eles mais felizes com seus ganhos.

Ou seja, normalmente, os homens mostram-se os homens mais preocupados que as mulheres em relação a ter dinheiro. Ao mesmo tempo, as mulheres costumam tratar o dinheiro mais como uma ferramenta do que como um objetivo, por privilegiarem o bem-estar e as relações.

Mas toda generalização pode ser duvidosa quando se trata de um assunto com tantas influências pessoais e externas.

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